terça-feira, 16 de março de 2010

Les Deux Alpes - Fora de Pista

    E' o segundo post que escrevo sobre Les Deux Alpes, no entanto, nada tem haver com minhas ferias e sim com uma aventura que tivemos la, na ultima sexta-feira dia 12 de Março 2010, que considero agora nosso aniversario, como se tivessemos nascido novamente, eu e o David, e o celebraremos todos os anos.

    Começamos pelos protagonistas, Alexandre França (Gaucho Escoces) e David Garcia (Asturiano), que resolveram, um dia antes de acabar as ferias nos Alpes embarcar em uma aventura fora de pista (off piste) que consiste em sair da parte das montanhas onde esta a estaçao de esqui e ir para a parte onde nao existem pistas, onde nao esta nada preparado, onde nao ha segurança, onde ha risco de avalanche, onde ninguem sabe onde estas e onde podes acabar quebrando uma perna, rompendo a cabeca ou ate caindo de um principicio. Bem, e' claro que tinhamos a coisa mais ou menos controlada, vimos o mapa  e la havia uma linha amarela indicando que se poderia fazer um fora de pista. E' uma coisa bem comum entre esquiadores, nossa ideia nao foi nada anormal. Incluso esta marcado no mapa da montanha, ou seja, se tens bala na agulha e culhoes, podes fazer.... e isso nao nos faltava!

    Logo no inicio estavamos investigando onde comecariamos nossa aventura, olhamos para baixo e combinamos "vamos por ali e depois por aqui e ali ...e passamos por aquelas pequenas pedras e vamos indo ..."

Quando ainda estavamos investigando a montanha, fizemos um video  de brincadeiras, bancando os abobados dizendo coisas do tipo "estamos gravando porque se ao final da aventura, nao a podemos contar, pelo menos que conte a camera"  e nesse momento nao tinhamos nem puta ideia da situação em estariamos metidos 1 hora mais tarde.




   Comecamos a descer montanha abaixo,  no inicio nao era tao inclinado e a paisagem era muiiito afude, coisa de filme, nao se via tracos de civilização, um silencio mortal, uma paz incrivel e eu e o David descendo a montanha juntos. Estavamos em uma zona digna de documentarios do globo reporter! A neve era virgem, fofa e em po', oque deixa a aventura ainda mais interessante.

   Chegamos em o ponto onde havia um pedra grande e decidimos, ao inves de ir pelo lado esquerdo, onde ja se via algumas marcas de outros esquiadores, ir pelo lado direito onde a neve ainda era virgem e po'. Olhamos para baixo e parecia bastante inclinado, em fotos e video nao ha como comparar, mas ao vivo e em cores, parecia algo proximo dos 70 graus de inclinação. Mas isso nao nos colocaria medo, nao sou um expert na coisa, mas ja tenho alguma experiencia e sabia que poderia descer isso, com um pouco de esforco e' claro.






   Penso que a frase chave que ficou gravado no video de David, foi o momento que ele diz "por ai vamos baixar, nao se ve muito bem mas ...".  Se tivessemos prestado um pouco mais a atenção na situação que se estava desdobrando a nossa frente, nao teriamos baixado ali, mas estavamos cegos com a sensação de liberdade e confianca que o ambiente nos proporcionava, seguimos viagem.

   Eu fui primeiro porque David queria que eu gravasse um video seu, fazendo piruetas na neve fofa, jogando neve a 2m metros de altura e dando alguns saltos. La' fui eu, baixando aquela encosta, um pouco cagado mas sabendo que tinha controle total da minha snowboard. David me tomou uma foto enquanto baixava, uma das fotos mais lindas da nossa viagem.  Ali apareco eu, um pouco confuso, pois logo que desci uns 30m, percebi que aquelas pedras estao ali, nao era pedras mas sim o inicio de um desfiladeiro de uns 20m de altura. E' incrivel como vendo de cima, a neve, por ser totalmente branca, nos aplica golpes oticos. Ha uma diferenca de 20m de altura entre o chao antes das pedras e o chao depois das pedras, na foto acima. Mesmo assim David desceu e resolvemos ir mais ou menos 40m para a esquerda, onde parecia que o desfiladeiro acabava e os dois planos se juntavam.




Nesse momento, decidimos subir alguns metros e deslizar para a esquerda. Pois foi nesse momento que eu poderia dizer que comecei a ver que a coisa se complicava. David estava 5m acima de mim e me dizia "Alex, saca la tabla y la usas para subir"  mas ele nao se deu conta que eu estava sentado na neve, olhando para baixo, a 2m metros do desfiladeiro, em um parte bem inclinada e tinha com a prancha cravada na neve.
 
Naquele momento, a unica coisa que me impedia de deslizar montanha abaixo era ter a prancha cravada na neve, mas quanto mais eu me movimentava, a prancha se aproximava das pedras e perto das pedras ja nao havia tanta neve assim para frenar minha descida. Eu nao poderia tirar a prancha dos pes e tao pouco conseguia subir sentado... com muito esforco, consegui andar de lado para uma zona que era menos inclinada, David desceu um pouco e eu consegui me virar, tirar os pes da prancha e usa-la  como apoio para comecar subir. A situação me pareceu complicada, mas tao pouco era para muito, tinhamos tudo sob controle e a unica coisa que tinhamos que fazer era subir um pouco  para poder deslizar uns 40m de lado, chegar onde os dois planos de chao se juntavam.  Nao havia motivo para desespero, ainda ! (Nao se nota na foto, mas 1 metro atras de mim, esta os desfiladeiro).

   Foi nesse momento que passaram 5 franceses, esquiando Off piste  tambem, la' embaixo e nos viram naquela situação e gritaram "Voces vao ter de subir e dar a volta na pedra, nao ha saida pelos lados". Entao olhei o David e disse: "Subir? bom, vamos nessa ...sao uns 30m, usando as pranchas vamos conseguir chegar em meia hora". Os Franceses se foram e nos comecamos nossa escalada, que parecia bem factivel. Passaram-se 25 minutos de subida e eu consegui andar somente 10m, David conseguiu ir um pouco mais, uns 15m. Foi nesse momento que minhas maos comecaram a tremer e tive de parar, me faltava energia. Exposto a baixas temperaturas e fazendo um esforco muito grande em um curto espaco tempo, esgotei minhas reservas. Nos nunca paravamos para almocar, pois nao queriamos perder tempo comendo, entao sempre levavamos frutas e sanduiches ...e como de costume, naquele dia, nao tinhamos comido muito.Por sorte, ainda havia comida comigo, parei para comer e o David seguiu. Foi ai que eu vi, que nao daria mais para mim subir, na situação que eu estava, ja nao conseguiria mais...David que tinha um pouco mais de energia (ou adrenalina) seguiu por mais 5 metros, e decidiu que nao daria para ele tambem, pois comecou a ter vertigos e sentir-se tonto.  Seria impossivel para nos subir mais 20 metros naquelas circunstancias (sem energia, quase pendurados em uma parede de neve, eu tremendo sem forcas e David tendo  tonturas e vertigo). David, me disse "Alex, ja estou tonto se eu ficar aqui mais 10 minutos, nao vou ter mais energia para nada, vou fazer algo...tu ficas aqui e eu volto para te buscar". Eu vendo a gravidade da situação, nao queria ficar pendurado la sozinho mas sabia que ele estava numa melhor situação para fazer algo, entao concordei, mesmo sem saber oque o louco tinha em mente.

     Em um ato um pouco inconsequente e jogando com a sorte, ele deslizou de lado e foi parar exatamente onde o grupo de franceses nos havia dito que nao havia saida ...eu quase enlouqueci, pois sabia que se ele ficasse preso la, eu teria que fazer algo. A partir desse ponto, tenho que contar a historia por duas perspectivas, a minha que fiquei la sozinho  e a de David que tentava chegar la embaixo escalando montanhas com a prancha na mao e fora da minha vista.

    Perspectiva 1 (Alexandre):  Fiquei eu la, sozinho e o David se foi ...depois de 10 minutos eu ja nao lhe podia ver mais, pois ele foi para tras de umas pedras. Comecei a chama-lo, cada vez mais alto, minha voz ecoava pelo vale mas o David nao respondia. Duas coisas me assustavam muito, uma era o fato de o David nao me responder, a outra era que cada vez que eu gritava, bolas de neve desciam rolando,  pensei que ia causar uma avalanche. Passaram-se 20 minutos e eu la, no meio da montanha pendurado em minha prancha, que estava cravada meio metro acima da da minha cabeca, e nada do David. Em esses 20 minutos, eu ja havia feito a digestao da comida e tinha energia, ja nao tremia mais as maos, entao pensei  "Se eu nao tiver nenhuma noticia do David, vou ter de ir la ver oque aconteceu". Eu tinha medo que ele tivesse caido sobre pedras e ali ficasse inconsciente ou pior. Por outro lado pensava tambem coisas do tipo "Sera' que consigo passar a noite aqui e no outro dia alguem vai me ver?" e eu mesmo respondia a mim mesmo "Nao Alexandre, a temperatura baixara facilmente a -20C aqui na montanha, hipotermia chegara' em algumas horas e eu perderia forcas",  Eu tinha consciencia de que alguma coisa extrema teria que fazer, caso David nao tivesse conseguido!


    Depois de quase 30 minutos de total silencio, escutei ruidos de alguem deslizando montanha abaixo e entao me dei conta que ele tinha conseguido chegar e estava vivo, no entanto, ainda nao tinhamos contato visual.  Passaram-se 10 minutos e ouvi ele gritando la de baixo, mas como o eco se sobrepunha 'as vozes, nao se podia entender nada. Foi ai, que em momento de desespero, vendo-me pendurado la, ele gritou em Ingles (nos nunca falamos em Ingles quando estamos sozinhos) "hang on Alex, stay there" e desceu montanha abaixo com sua prancha, dando-lhe muita canha,  para buscar ajuda.


    Perspectiva 2 (David): Quando ele foi para o canto esquerdo, onde nos haviam avisado que nao havia saida, chegou a um ponto onde realmente ja nao havia mais como deslizar, sacou os pes da prancha e comecou a caminhar de lado na neve, sempre cravando a prancha primeiro, logo o pe' direito e entao o esquerdo ...e assim prosseguiu por uns 5m ate que nao havia mais onde pisar, ele quase ficou suspenso somente pela prancha que estava cravada na neve na altura de seu peito, oque nao lhe deixava muita forca para mover-se. Foi ai que ele pensou muito, levou em consideração que ja se estava fazendo-se noite e que ninguem mais iria nos ver la, jogou com sua vida e decidiu saltar. Ja se via que o desfiladeiro nao era tao alto (uns 4 ou 5 metros calculo eu), mas nao se sabia oque havia la embaixo, neve, gelo ou pedras. Bem, ele saltou e caiu na encosta da montanha, na neve, mas como era bastante inclinada, ele caiu rolando montanha abaixo por mais 100m ateh que finalmente conseguiu parar. Esse foi o ruido que escutei quando estava la sozinho e nao conseguia ve-lo.



   Quando ele foi buscar ajuda, eu fiquei la sozinho novamente e claro, nao queria entrar em panico pois sabia que  panico era oque ia me afundar, entao decidi pegar a camera e seguir documentando para que, literalmente,  "se nao pudesse contar eu, que contasse a camera".  Para ter uma ideia da inclinação de onde fiquei, tomei fotos. Fiquei la, comendo barrirnhas de cereais e tomando um mate amargo que carregava na mochila e de tempos em tempos falava comigo mesmo "que merda tu tinha na cabeça quando se meteu aqui Alexandre???"  De alguma forma, conversar comigo mesmo, me fez ficar calmo todo o tempo...eu tinha dialogos longos, do tipo "Alexandre Alexandre, olha onde tu ta' ...sera' que vai estar hoje de noite no apartamento com os guris, tomando uma ceva contando tudo e dando risadas??".

 




    David demorou uns 30minutos ate' chegar la embaixo e contactar alguem. Eu, la na montanha ainda esperando que algum trator de neve viesse me buscar. Escutei som de motores perto mas logo sumiram. Depois fiquei sabendo que eles tinha vindo com algum veiculo de neve, me viram com binoculos e mas nao seriam capazes de me tirar de la com o equipamento que tinham.

 



    Nesse momento, eu nao sabia se iam chamar um helicoptero ou se conseguiriam me tirar de la com tratores. Mas fiquei muito feliz por escutar motores. Mas logo me dei conta, que onde estava eu, nao havia outra maneira, somente de helicoptero. Que confusao armamos !!




   O momento que o helicoptero parou sobre mim e um magrao saltou na neve com uma corda, foi bastante assutador, pois aquela maquina estava  3 metros acima de mim, pairando no ar e fazendo muito vento. Pensei que as helices iam tocar a neve, pois eu estava em um plano inclinado, entao ia eu, o magrao que tinha saltado e o helicoperto, todo mundo pra banha !!

   Amarrei-me com a tal corda e me levantaram com a helicoptero...por 2 minutos, fiquei eu balancando no ar como um pendulo caotico pois o helicoptero comecou a mover-se, era bastante assustador no entanto eu estava super ultra tri calmo. Cheguei a pensar que me levariam ao topo da montanha assim pendurado, mas nao, me puxaram para dentro e me levaram abaixo, onde havia uma ambulancia ja esperando-me. Logo, o helicoptero teve de voltar para pegar o carinha que tinha saltado para me resgatar, ele tinha a minha prancha e minha mochila.




     A ambulancia me levou para o medico e la queriam me examinar, fazer raio x e o caralho....mas eu pulei fora, pois iam me cobrar £150 e eu sabia que estava em perfeitas condicoes. Igual tive de pagar £60 pela ambulancia. No caminho, estive conversando com o motorista e ele me perguntou se eu tinha seguro, eu disse que sim, entao ele disse que era boa noticia pois eu poderia cobrar o valor da ambulancia da seguradora e o os £1.600 do helicoptero tambem.... dai eu quase desamaiei.  Quando sai do ambulatorio local, fui caminhando para casa, que nao era longe e avistei o David, caminhando de um lado para outro na sacada do apto como se estivesse esperando um filho,  e entao gritei  "hey cabron, estoy aqui!!!!", ele abriu um sorriso largo e foi me esperar na porta do elevador.



    E assim acabou nossa aventura, chegamos em casa, contamos aos outros guris que estavam conosco, que em primeiro momento nao acreditavam. Acabamos celebrando o sucesso da operação com uma boa comida e um excelente vinho dos alpes franceses.



  Conclusao:

   Nao foi somente uma decisao que nos levou a tal situação, mas uma cadeia de fatos:
   - Nao comer apropriadamente
   - Fazer off piste as 4 da tarde, quando a estação fecha as 5...
   - Nao seguir as pegadas dos outros
   - Nao levar celular junto
   - Nao estudar o terreno primeiro, por baixo
   - Sair um pouco fora da linha do mapa

   Lição aprendida: Tudo que esta listado acima, deve ser feito ao contrario, para estar seguro de que se algo passe, alguem saiba como chegar ate' voce.

domingo, 14 de março de 2010

Les Deux Alpes

Escrevo para contar sobre a maravilhosa semana que passei em um vilarejo no meio dos Alpes, no sul da Fanca, quase fronteira com a Italia, chamado Les Deux Alpes.

Passamos basicamente uma semana nesse pequeno povoado, no meio das montanhas, fazendo nada mais que esquiar o dia todo e aproveitar o apres ski 'a tardinha, no Le Pano Bar e logo no Veronica's.

Aqui vao as dicas para quem estiver interessado em viajar ao Les Deux Alpes:

O David organizou tudo, alugou um apartamento para 6 pessoas no conjunto de predios chamado Le Flocon D'Or, o preco ficou em £110 por pessoa. Esta ao pe' de uma das montanhas, isso significa se pode sair porta a fora os Esquis postos ja'.  Ha que levar roupa de cama, pois eles nao proveem capas de travesseiro, lencois e toalhas, mas por £10  pode-se alugar, caso nao queiras levar contigo. Eu levei tudo, ja que estava querendo economizar o maximo possivel!

Para chegar la', nos voamos 'a Grenoble, alugamos 2 carros que nos sairam por £60 por pessoa. Do aeroporto de Grenoble ate' Les Deux Alpes, sao apenas 1h 30min. A viagem nao e' longa e tao pouco chata, pois logo saindo da autopista ja comeca a se ver paisagens lindas.

Ha muitos pubs e vida noturna, mas claro como eu estava la para fazer snowboard, nao tinha  interesse em ficar na rua ate' muito tarde, mas para quem quer curtir um pouco de agito, tem opcoes! Mas nao havia somente vida noturna,  vida diurna tambem !!



Todos os dias de das 15h ateh as 17h, havia um bar, atras das montanhas, com nada em volta, apenas neve, que colocava musica  ao ar livre numa pista de danca e a galera ficava la tomando uns tragos, dancando, saltando e agitando ... os caras montam um abiente muito afudê (ja estava com saudades de dizer isso)  'a 2600 m de altitude no meio do nada, incrivel !



Ficam ai as dicas de umas ferias budget...voar a Grenoble, alugar carro, viajar a Les Deux Alpes e passar uma semana de puta madre no Le Flocon D'Or.